Desenhos

5.11.06

Texto - HH 2

“ A esse propósito há que acrescentar algo. Muita gente existe que se assemelha a Harry; especialmente muitos artistas pertencem a essa classe de homens. Todas essas pessoas tem duas almas, dois seres em seu interior; há neles uma parte divina e uma satânica, há sangue materno e paterno, há capacidade para a ventura e para a desgraça, tão contrapostas e hostis como eram o lobo e o homem dentro de Harry. E esses homens, para os quais a vida não oferece repouso, experimentam às vezes em seus raros momentos de felicidade tanta força e tão indizível beleza, a espuma do instante de ventura emerge as vezes tão alta e deslumbradora sobre o mar da dor, que sua luz, espargindo radiância, vai atingir a outros com o seu encantamento. A isto se devem, a essa preciosa e momentânea espuma sobre o mar do sofrimento, todas aquelas obras artísticas em que o homem solitário e sofredor se eleva por uma hora tão alto sobre o seu próprio destino, que sua felicidade brilha como uma estrela, e parecem a todos os que a vêem como algo eterno e como se fosse seu próprio sonho de ventura. Todas essas pessoas sejam quais forem seus atos e obras, não tem propriamente uma vida, ou seja, sua vida carece de essência e forma, não são heróis, nem artistas, nem pensadores da maneira como os demais homens são juizes, doutores, sapateiros ou mestres; sua existência é um movimento de fluxo e refluxo, está infeliz e dolorosamente partida e é sinistra e insensata, se não estivermos propensos a ver um sentido precisamente naqueles raros acontecimentos, ações, pensamentos e obras que brilham as vezes sobre o caos de semelhante vida.” H.H.

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